Música Sem Dor: Um Guia para Jovens Músicos sobre a Saúde Orofacial
- Liliana Mores

- 24 de out.
- 4 min de leitura
Introdução: Sua Música, Seu Corpo
Sabemos da paixão e das horas de dedicação que você investe no seu instrumento ou na sua voz. Assim como um atleta de alta performance, precisa cuidar dos músculos para evitar lesões, um músico precisa cuidar dos "músculos da música". Como dentista que trabalha com músicos, vejo todos os dias como a técnica instrumental e a saúde corporal estão interligadas.
Este post foi criado para te ajudar a entender e, mais importante, a prevenir um tipo comum de dor que pode afetar sua prática e performance: a dor orofacial. Vamos aprender juntos a tocar com mais saúde, para que sua música nunca precise parar.
1. O Que é a Dor Orofacial?
De forma simples, a dor orofacial é um desconforto que afeta os músculos e as articulações do seu rosto, cabeça, pescoço e ombros. Para um músico, que usa intensamente essa região, é fundamental reconhecer os primeiros sinais.
A dor pode se manifestar de várias formas e em diferentes locais:
• Na mandíbula: Dificuldade, dor ou estalos ao abrir a boca para cantar, formar uma embocadura ou simplesmente ao bocejar após uma longa prática.
• No rosto: Sensação de cansaço ou queimação nos músculos da bochecha, especialmente para instrumentistas de sopro ou cordas que usam o mento (queixo) (violino/viola).
• Na cabeça e pescoço: Dores de cabeça, tensão ou dor no pescoço e nos ombros que parecem surgir ou piorar, sempre que você pratica.
Essa dor pode surgir do uso repetitivo e intenso dos músculos, algo muito comum na vida de quem se dedica à música.
2. Músicos e a Dor: Por que Alguns Sentem Mais?
Você já se perguntou se o seu instrumento pode influenciar a chance de sentir esse tipo de dor? Um estudo recente, com jovens músicos, trouxe uma resposta clara. A conclusão é esta: se você é instrumentista, sua chance de sentir dor durante a prática, é mais do que o dobro da de um vocalista. A pesquisa descobriu que, enquanto 17,2% dos vocalistas sentem dor ao se apresentar, mais de 41% dos instrumentistas que usam ativamente a mandíbula (como violinistas e flautistas) relataram o mesmo.
Isso acontece porque certos instrumentos exigem um esforço constante e específico dos músculos do rosto e da mandíbula. Veja na tabela abaixo, onde seu instrumento se encaixa:
Mas, se os instrumentistas sentem mais dor, o que os vocalistas fazem de diferente que pode nos ensinar uma lição valiosa?
3. O Segredo dos Vocalistas: O Poder do Aquecimento!
Então, qual é a superpotência dos vocalistas que os protege da dor? Não é mágica. É um hábito simples e poderoso, que a grande maioria dos instrumentistas ignora.
O estudo revelou que, 75% dos vocalistas aquecem os músculos da mandíbula e do pescoço regularmente, enquanto menos de 13% dos instrumentistas fazem o mesmo.
Essa é uma descoberta poderosa! Isso sugere fortemente que o aquecimento tem um papel protetor, preparando os músculos para o esforço e ajudando a prevenir a dor. É um hábito simples, que todo músico pode adotar para uma carreira mais longa e saudável.
4. Seu Plano de Ação: Pratique com Paixão e Cuidado
Incorporar um aquecimento na sua rotina, é mais fácil do que parece e pode fazer toda a diferença. Aqui está um plano de ação, para você começar hoje mesmo:
1. Aqueça Sempre Antes de pegar no seu instrumento, dedique de 3 a 5 minutos para preparar seu corpo. Assim como você afina o instrumento, "afine" seus músculos.
2. Movimentos Suaves Imagine que há um lápis na ponta do seu nariz, e desenhe pequenos círculos no ar, primeiro para um lado, depois para o outro. Para a mandíbula, coloque as pontas dos dedos na frente das orelhas, sinta a articulação e abra a boca lentamente, apenas até sentir o primeiro movimento, sem forçar.
3. Relaxe a Tensão Durante a prática, faça uma "verificação de tensão", a cada música. Solte a mandíbula (seus dentes não devem se tocar), deixe os ombros caírem para longe das orelhas e respire fundo. Muitos músicos, tensionam os músculos da mandíbula sem perceber, especialmente em passagens difíceis.
4. Faça Pausas Sessões de prática muito longas e sem interrupção, aumentam o risco de sobrecarga muscular. O estudo mostrou a importância das pausas. Programe pequenos intervalos para se levantar, alongar e dar um descanso aos músculos.
Nota Importante: Seu corpo é único, e a forma como ele interage com seu instrumento é específica. Os exercícios certos para um violinista, podem não ser os ideais para um trompetista. Para um plano de exercícios personalizado e seguro, é sempre recomendado procurar a orientação de um profissional, como um dentista especializado em saúde de músicos.
Conclusão: Toque por Toda a Vida
Sua habilidade musical é um presente, que merece ser cuidado. Ao tratar seu corpo com o mesmo respeito e atenção que você dedica ao seu instrumento, você estará prevenindo a dor, e investindo no seu futuro.
Cuidar do seu corpo é cuidar da sua música. Toque com paixão, pratique com inteligência e desfrute de uma vida inteira de música sem dor.
Fonte: NAIR, R.; TANIKAWA, C.; FERREIRA, J. N. Orofacial pain, musical performance and associated coping behaviors, psychological distress and disability among Asian young adults. Journal of Clinical Medicine, v. 12, n. 4, p. 1271, 2023. DOI: https://doi.org/10.3390/jcm12041271
Liliana Mores
Cirurgiã-dentista CRO/SC15297




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